UMA QUESTÃO DE VIDA OU MORTE: A NECROPOLÍTICA DO ACESSO À JUSTIÇA

Autores

  • Élida de Oliveira Lauris dos Santos Universidade de Coimbra

Palavras-chave:

Acesso à Justiça, Pensamento Abissal, Necropolítica, Poder, Governamentalidade

Resumo

O desafio analítico proposto por este artigo é explorado primeiramente a partir dos seus limites, o que vou denominar, com base em Santos (2007a), divisões abissais do acesso à justiça. O meu principal argumento é que a ação soberana do Estado que cinde o desenvolvimento civilizacional em zonas democráticas e estados de exceção é necropolítica (MBEMBE, 2003), isto é, na medida em que distribui de forma excludente e desigual os recursos políticos e económicos exerce um direito de veto sobre as condições de vida e, consequentemente tem um poder de decisão sobre a exposição à morte, dos grupos marginalizados. Um exercício de veto que uma estrutura de assistência jurídica pode interromper circunstancialmente, mas não pode derrubar. Nesse sentido, o papel da política pública de acesso à justiça não manifesta a garantia de livre desenvolvimento democrático do indivíduo dentro do Estado, mas a abertura de redes de ação e luta social empreendidas em diferentes escalas de realização do direito. Na parte final, pretendo demonstrar que adotar uma conceção emancipatória do direito implica substituir a afirmação única da democratização promovida pelo direito estatal através do acesso à justiça pela repetição dupla e recíproca dos regimes epistêmicos da democracia e sua exceção. 

Biografia do Autor

Élida de Oliveira Lauris dos Santos, Universidade de Coimbra

Doutora em Pós-colonialismos e Cidadania Global pelo Centro de Estudos Sociais e Faculdade de Economia, da Universidade de Coimbra. Foi pesquisadora do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Actualmente é coordenadora executiva e investigadora em pós-doutoramento do Projeto ALICE, onde desenvolve o projeto de investigação "Hérculeos juízes, cidadãos vulgares:estudo comparativo dos usos, do alcance e dos sentidos da transformação social escrita nas constituições da África do Sul e do Brasil". Tem experiência na área de Direito, com ênfase na sociologia do direito e dos tribunais e direito constitucional, actuando principalmente nos seguintes temas: acesso à justiça, independência judicial, reforma do judiciário, separação de poderes, judicialização da política, constitucionalismo e hermenêutica constitucional.

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Publicado

2016-11-09